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segunda-feira, 22 de março de 2010

MULHERES HEROINAS


Há muitos olhares sobre a mulher. Desde aquele de caráter “sensualóide”, passando pela escravização feminina nas famílias, ao olhar sobre a luta feminista, que busca sociedade mais justa e as possibilidades de um outro mundo possível.

Neste último sentido olho para mulheres lutadoras do Vale do Jequetinhonha. Refiro-me a mulheres que organizam outras mulheres na construção de soluções cotidianas para a sobrevivência dos filhos e famílias, as que lutam por transformações sociais. Nesse contexto a história do Brasil indica que o Jequetinhoha foi a última região a ser “descoberta” pelos portugueses. A escravização, portanto, não foi de africanos, mas de indígenas. A resistência de alguns povos se deu através de guerras com arco e flecha contra senhores fazendeiros armados de espingarda, chicotes, cavalos e cães. O povo indígena que mais se destacou foi o dos botocudos, que produziu grandes heróis, hoje apenas levemente lembrados como monumentos. Desse material histórico-humano saíram as “lavadeiras do vale” com seus cânticos de sereias, que se transformaram em donas de casa e trabalhadoras sem direitos trabalhistas. Delas há ainda a manifestação artística por meio de um grupo que aperfeiçoa poesias e cantos de sua terra sofrida e escrava. Apresentam-se na Europa e ao lado de grandes cantores brasileiros. São aplaudidas por grande públicos, mas continuam exploradas sem reconhecimento objetivo e financeiro de sua arte e de seus talentos musicais e artísticos. Da luta indígena contra os colonizadores escravocratas nasceram também as corajosas pequenas agriculturas, que, com suas calejadas mãos e sua pele torrada pelo sol causticante, produzem a subsistência para suas sempre numerosas famílias. Misteriosamente essas mulheres embelezam seus rostos com sorrisos semelhantes ao rio onde lavavam suas roupas e com o luar que refletia o sol que durante o dia queimava suas peles e cabelos. Essas mulheres guardam generosidade cultural impressionante: recebem os visitantes em suas casas feitas a mão e de pau-a-pique, extremamente pobres, em contradição com sua história e cultura, cozinhando raízes arrancadas com suas mãos feridas pela injustiça, sempre prontas a receber alegres e calorosamente a quem lhes visita. Seus olhares, carinho e receptividade são marcas de sua esperança e amor pela vida.

Contudo, há que continuar e qualificar lutas e esperanças que se enraízam nos indígenas. Essas fontes históricas passam pelas mulheres “lavadeiras do vale”, pelas pequenas agricultoras e chegam a admiráveis lutadoras intelectuais orgânicas (no dizer de Granschi), no combate de novos modelos de escravização, geradores de misérias de todas as conseqüências: alcoolismo, drogas, desagregação familiar, empobrecimento do Rio Jequetinhonha, assassinando peixes e camarões dos pescadores, poluindo o rio das lavadeiras, matando o solo agrícola, gerando juventude alienada e sem sonhos, que troca a arte pelas drogas. Esses sinais de morte e de vida se transformam em sonho e energia para a resistência em nossos tempos. Essas mulheres intelectuais, que assim resistem, formam cooperativas, advogam, educam, organizam as artesãs, politizam suas companheiras, constroem espaços entre outras mulheres e homens de setores sociais ditos mais conscientes etc. Esse é o Vale Jequetinhonha, ornamentado de contradições. Por um lado, esmagado pelos colonizadores e atuais coronéis e, por outro, construtoras da luta pelos direitos humanos por parte de mulheres, verdadeiras flores do vale, tais como a Irmã Rosa, a Alaide, a Agricultora Delita, As Lavadeiras em geral, a Advogada Regina, sem esquecer de alguns homens como Valdeque Bahia, Edmilson Alves e todas as estudantes que buscam sonhos de profissionalização e qualificação técnica, lembrando sempre meu querido Frei Emílio e suas aliadas, como a Marilene e tantas outras, que incansavelmente lutam pela terra através MST.

Percebe-se que a luta que se enraíza no confronto entre indígenas e colonizadores sanguinários, marcada pelo heroísmo muitas vezes esgotantes e sofridos das pessoas arroladas acima, precisa continuar. Essa luta alia-se a que se trava em todo o Brasil, por mulheres e homens trabalhadores/as, intelectuais, religiosos/as na construção da Independência do Brasil, na construção da Pátria Livre, Soberana e Independente.

Agradeço de coração a todas as mulheres com quem trabalhei, de quem aprendi o sentido da luta e da coragem de sonhar com uma sociedade marcada pela dignidade e pelo respeito ao outro. A vocês sempre sou e serei grata. Vocês não imaginam o que fizeram por mim. Sempre serão meu exemplo como mulher lutadora que sou e serei, alimentada pelo testemunho de vocês. Vocês me ensinaram como olhar com justiça para a mulheres guerreiras e lutadoras. Obrigada.

terça-feira, 9 de março de 2010

O QUE ACONTECEU COM AS MULHERES?


Repetidamente comemoramos o Dia Internacional da Mulher. Em torno dessa data uniram-se mulheres no mundo inteiro. Lutas contra as ditaduras sanguinárias que infestaram a América Latina contaram com as mobilizações encabeçadas pelas mulheres. Na Argentina as Mães da Praça de Maio marcaram com seus pés e lágrimas a luta contra a brutalidade que matou trinta milhões de jovens, até que viram ruir as muralhas da morte. No Brasil e em outros países pisados pelas botas do imperialismo as mulheres somando-se a todo o povo bradaram unidas o alvorecer da liberdade. Entidades de lutas pelos direitos da mulher ergueram-se altivas e fortes em todo o Brasil. A luta continua, com muito terreno a ser conquistado.
O que acontece hoje com as mulheres? Pergunto-me aqui com meus botões. Ao assistir e ler a mídia tenho a impressão de que o dia da mulher, nascido de grandes lutas por justiça e por igualdade, virou apenas ornamentação e banalização da mulher. Batons e cirurgias plásticas apenas iludem figurinos de mulheres que viraram demonstração de produtos, engrossando o vazio que toma conta da insignificância que a elite dominante atribui à mulher. Sinto a dor de quem foi enganada pelos que sempre “enrolam” o povo com seus cantos de sereias. Essa mídia, de propriedade da elite dominante, me frustra e entristece. Sinto-me traída.

Felizmente olho para as centrais sindicais e entidades femininas e vejo a causa salva e alimentada pelo mesmo espírito de luta por mais desenvolvimento com distribuição de renda. Vejo as mulheres lutadoras com as bandeiras da reformas agrária, urbana, da saúde, da educação, de reformas amplas sociais e econômicas empunhadas com coragem e consciência.

Vejo as minhas irmãs lutadoras embaladas pelos mesmos sonhos das que tombaram lutando pela vida de seus filhos. Nelas me inspiro para lutar. Nelas vejo o feminino que se mistura com o cio da terra e se ergue frondoso como a floresta amazônica. Nelas me encorajo a reciclar minha reflexão e minhas atitudes como mulher corajosa e aguerrida. Com elas sinto vontade de lutar sem acomodação e motivada pela criatividade inteligente. A inteligência de quem reflete e luta a partir do pensamento e das ações coletivas, libertas do individualismo das falsas liberdades e independências sem povo e sem comunidade.

Sei que a grande mídia retroalimenta as futilidades do mercado, colorindo a mulher de falsa beleza. Mas eu não quero essa feminilidade fútil. Quero ser mulher, sim. Orgulho-me de ser mulher. Mas quero ser mulher bonita, indígena, brasileira, lutadora e trabalhadora, que se enfeita e se embeleza à frente do espelho, mas que se embeleza muito mais com o perfume e a maquiagem das mulheres índias, negras e brancas que ajudam a construir uma sociedade mais justa e digna de nós e de nossos filhos. Quero ser mulher companheira e mãe, que participe da construção de uma história de qualidade de vida e de real liberdade coletiva para todos. Quero ser mulher liberta de machismos opressores, dos que gritam e humilham as mulheres. Quero ser mulher gentil acompanhada e amada por um homem gentil e generoso, capaz de lutar a meu lado em favor de uma sociedade feminista, generosa e gentil, onde meus filhos sejam livres do machismo bolorento e opressor.

Nesse sentido penso que vale a pena comemorar o Dia Internacional da Mulher. Viva as mulheres que lutam por real liberdade e independência!

Com carinho e luta, Jucilene Barros – Guríndia.

Amiga mulher

Jocilene Pereira Barros

É dificílimo ser mulher. Ser mulher com e para outra mulher, então, chega a ser doloroso. Nos relacionamentos sociais e familiares é comum mulheres pensarem e agirem com a mentalidade machista, a mesma que orienta muitos homens a usar as mulheres a seu belo prazer e a destruí-las quando não se submetem aos seus caprichos.

Amiga, em qualquer circunstância não se coloque contra uma mulher. Não se guie por fofocas para destruir outra mulher. Nunca mude sua avaliação sobre outra mulher só porque alguém a julga disso ou daquilo.

Amiga, por gentileza, lhe digo quase gritando, seja sempre solidária com outra mulher. Liberte-se dos vícios machistas que afirmam “que mulher não vota em mulher”, “que mulher se veste para outras mulheres”, “que mulher não é amiga de outras mulheres, mas suas concorrentes” etc.

Amiga, seja a primeira a ser solidária com outra mulher, aconteça o que acontecer, mesmo que o mundo inteiro se coloque contra ela. Seja solidária e não garimpeira oportunista de possíveis erros em sua amiga, para sair ao mundo gritando que a crucifique. Seja solidária e não aproveitadora que só sabe ser amiga quando usufrui de benefícios dela e respeite-a quando ela fizer escolhas diferentes das suas e com as quais até discorde. Ela merece seu respeito e seu amor.

Ser independente não é somente ter profissão de destaque, concorrer a cargos de prestígios e públicos, mas pensar como uma mulher deve pensar, com seu próprio cérebro feminino. Pensar como mulher é superar a concorrência machista, que entende que as mulheres só podem vencer sob as asas dos homens.

Falo de mim mesma e compartilho dessa dor com você, amiga, que por escolha pessoal enfrento enorme discriminação. Para meu espanto muitas mulheres supostas amigas me discriminam. Porém, passo por um momento difícil, mas não me curvarei em face dos preconceitos. Estou magoada e triste, mas jamais derrotada.

Assim é a alma de uma mulher.

Com coragem, Jucilene.

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